23 - MULHERES
O
trabalho mediúnico oferece insuspeitadas condições de aprendizado. Cada sessão
traz as suas surpresas; cada manifestação suas lições e ensinamentos. A
contínua observação desse vaivém de companheiros desencarnados, o desfile
trágico de problemas, angústias, dores e ódios, a força irresistível do amor,
as maravilhas da prece, o poder do passe, constituem experiência inesquecível
para aqueles que, ao longo dos anos, entregam-se a essas tarefas redentoras.
Uma pergunta poderá ser colocada
agora. Que papel representam as mulheres, nesses dramas que se desenrolam
entre os dois mundos? Há mulheres obsessoras? Há mulheres que se vingam, que
perseguem, que odeiam? Sim, mas em número bem mais reduzido que os homens.
*
Antes de
prosseguir, talvez sejam convenientes algumas observações de caráter
doutrinário.
O
Espiritismo ensina que o Espírito não tem sexo, podendo encarnar-se como homem
ou como mulher, em diferentes existências, mas que costuma escolher,
preferentemente, um ou outro sexo, renascendo continuamente como homem ou
mulher. (Questões números 200
a 202, de “O Livro dos Espíritos”.) Ao comentar as
respostas, Kardec escreveu o seguinte:
“Os
Espíritos encarnam como homens ou como mulheres, porque não têm sexo. Visto que
lhes cumpre progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, lhes
proporciona provações e deveres especiais e, com isso, ensejo de ganharem
experiência. Aquele que só como homem encarnasse só saberia o que sabem os
homens.”
Dessa
forma, não são muito precisas as expressões Espírito feminino e Espírito
masculino, que são usadas à falta de outras. A questão é bem mais complexa do
que parece à superfície.
Certa
vez, perguntei a um amigo espiritual por que difere tanto, na sua estrutura
psíquica, o Espírito encarnado como homem, daquele que se encarna como mulher.
O homem é mais agressivo, dado a gestos de coragem física, menos sentimental,
ao passo que a mulher inclina-se mais à compassividade, à renúncia, ao recato,
sendo, portanto, mais acessível à emoção e aos sentimentos. Por que isso, se,
não tendo sexo, os Espíritos deveriam ser assemelhados?
Disse-me
ele, coerente com os postulados doutrinários, que, como Espíritos, conservam
características em comum, mas, ao se reencarnarem, aceitam condições que lhes
facultam desenvolvimento de certas faculdades, em detrimento de outras; ou
melhor, optam pelo aprimoramento de alguns aspectos espirituais em que estejam
particularmente interessados.
Assim é,
realmente. Como a perfeição deverá resultar, um dia, do desenvolvimento
harmonioso de todas as faculdades possíveis ao ser humano, é natural que este
tenha que ir por etapas, cultivando-as em buques, até que, alcançando o ponto
desejado, possa encetar outras realizações.
Tentemos,
não obstante, ampliar um pouco mais a questão, na esperança de alcançar uma
visão mais clara de suas dificuldades. Ao responderem à pergunta formulada por
Kardec (Têm sexos os Espíritos?), os instrutores informaram o seguinte:
“Não como
o entendeis, pois que os sexos dependem da organização. Há entre eles amor e
simpatia, mas baseados na concordância dos sentimentos.”
Certamente
que sentiram, esses instrutores, que não era tempo, ainda, de aprofundar mais a
questão, mas disseram o bastante para compreendermos alguns pontos essenciais.
De fato, a Doutrina nos ensina, alhures, que o ser encarnado resulta de um
“arranjo” entre três componentes distintos: espírito, perispírito e corpo
físico. Ao declararem que o sexo depende da organização, deixaram bem entendido
que a diferenciação sexual não alcança o núcleo da individualidade,
representado pelo Espírito imortal, pois fica contida nos limites extremos da
organização perispiritual.
Por outro
lado, Emmanuel informa, em resposta à pergunta número 30: “Há órgãos no corpo
espiritual?” (1), que sim, pois o corpo físico “e uma exteriorização aproximada
do corpo perispiritual”, e prossegue acrescentando que tal exteriorização “subordina
(-se) aos imperativos da matéria mais grosseira, no mecanismo das heranças
celulares, as quais, por sua vez, se enquadram nas indispensáveis provações ou
testemunhos de cada individuo”.
Essa
interdependência entre corpo físico e perispírito é acentuada por André Luiz
(2) ao declarar que:
“Os
cromossomos, estruturados em grânulos infinitesimais de natureza
fisiopsicossomática, partilham do corpo físico pelo núcleo da célula em que se
mantêm, e do corpo espiritual pelo citoplasma em que se implantam.” (Destaques
meus.)
É
bastante compreensível, pois, que os seres que trazem o perispírito ainda
espesso, regressem ao mundo póstumo, pela desencarnação, com uma pesada carga
fluídica, profundamente impreg
(1) “O
Consolador”. FEB, 4ª edição, capítulo 1 — “Ciências Fundamentais: Biologia”.
(2) Evolução em dois Mundos”, 3ª
edição, capitulo 6º, página 50..
nada de
materialidade e, por conseguinte, de sensações e necessidades bem semelhantes
às que experimentava na carne.
Isto é
confirmado pelos relatos mediúnicos, sendo a série André Luiz bastante rica em
informações desse tipo. Para não alongar demais esta digressão, sugiro a
releitura do capítulo 99 de “Nosso Lar”, sob o título “Problema da
alimentação”.
Informa
Lísias que, há cerca de um século, a questão alimentar era muito séria ali na
colônia. Muitos dos recém-chegados da carne “duplicavam exigências”. Queriam
mesas lautas, bebidas excitantes, “dilatando velhos vícios terrenos”. Quando a
direção da colônia tomou providências mais enérgicas para coibir os abusos,
estabeleceu-se um comércio clandestino com os representantes das trevas que,
agindo, como sempre, através das brechas que as nossas paixões inferiores lhes
abrem, utilizavam-se desse lamentável intercâmbio como instrumento de
infiltração e assalto à vasta organização regeneradora intitulada “Nosso Lar”.
Foram
implantadas severas medidas de correção e reajuste, mas os alimentos não foram
totalmente abolidos, em virtude da condição perispiritual, ainda bastante
densa, da grande maioria dos que habitam aquela colônia.
No
capítulo 18 dessa mesma obra, Laura informa que:
—
“Afinal, nossas refeições aqui são muito mais agradáveis que na Terra. Há
residências, em “Nosso Lar”, que as dispensam quase por completo; mas, nas
zonas do Ministério do Auxílio, não podemos prescindir dos concentrados
fluídicos, tendo em vista os serviços pesados que as circunstâncias impõem.
Despendemos grande quantidade de energias. É necessário renovar provisões de
força.” (Destaques meus.)
Portanto,
a alimentação com substâncias concentradas é ainda indispensável, mesmo para
aqueles Espíritos mais esclarecidos, que se entregam a tarefas redentoras,
ainda que mais humildes.
Assim, da
mesma forma que os problemas alimentares, os de sexo não ficam totalmente
eliminados por um passe de mágica, simplesmente porque se deu a desencarnação.
Espíritos enredados nas tramas da sensualidade, tombam em situações calamitosas
no mundo póstumo. Somente os mais purificados conseguem libertar-se dos apelos
da carne.
— “Entre
os casais mais espiritualizados — informa Laura a André —, o carinho e a
confiança, a dedicação e o entendimento mútuos permanecem muito acima da união
física, reduzida, entre eles, a realização transitória.”
“Inútil é
supor — diz um elevado instrutor (1) — que a morte física ofereça solução
pacífica aos espíritos em extremo desequilíbrio, que entregam o corpo aos
desregramentos passionais.
A
loucura, em que se debatem, não procede de simples modificações do cérebro:
dimana da desassociação dos centros perispiriticos, o que exige longos períodos
de reparação.” E, mais adiante:
“Convictos
desta realidade universal (a aquisição gradativa das virtudes) não podemos
esquecer que nenhuma exteriorização do instinto sexual na Terra, qualquer que
seja sua forma de expressão, será destruida, senão transmudada no estado de
sublimação.” (Destaques meus.)
Não resta
dúvida, portanto, do estudo doutrinário e das observações colhidas, por
Espíritos credenciados, no imenso laboratório da vida, que o sexo persiste no
mundo póstumo, até que seja sublimado. A sublimação há de marchar, por isso,
junto com a sutilização progressiva do Espírito, pois que, chegado à condição
de pureza, o sexo será, para o Espírito, apenas a lembrança de uma experiência
valiosa que, entre outras, lhe serviu de degrau para a sua escalada.
Retomando,
porém, nossas perguntas iniciais, poderemos responder que, infelizmente,
Espíritos que passaram por experiências no sexo feminino também odeiam,
perseguem, obsidiam. Alguns são mesmo particularmente agressivos, rancorosos e
violentos. É que; levando para o Além as suas frustrações, seus desvios, suas
ânsias, recaem, fatalmente, em faixas desarmonizadas, onde se consorciam com
outros seres igualmente desarvorados, para darem prosseguimento ao exercício
das paixões incontroladas. Nesse estado, continuam mulheres, sentindo e agindo
como tais. Exercem seus poderes de sedução sobre outros seres, ganham
“vestimentas”, “jóias”, “sapatos” e “perfumes”, a troco de favores. Prestam
serviços tenebrosos junto a companheiros encarnados, mancomunados aos seus
comparsas das sombras, que lhes asseguram uma “boa vida” de prazeres e proteção
contra a dor que as espera fatalmente, para o reencontro, um dia, lá na frente.
(1) “No
Mundo Maior”, FEB, 5ª edIção, capitulo 11 — “Sexo”.
De outras
vezes, são escravizadas, reduzidas à condição mais abjeta, e seviciadas,
perambulando, dementadas, em andrajos imundos, por vales de sombras espessas,
até que, desgastadas pelo sofrimento, tenham um impulso de arrependimento que
lhes possibilite o socorro de que tanto necessitam.
Temos
tido algumas experiências com espíritos femininos. Já lembrei, noutro ponto
deste livro, o caso da irmã que se empenhava em perturbar uma família,
tentando destruir um lar, para o que contava com o apoio de um sacerdote
desencarnado, que a incentivava, e a isentava de culpa, “absolvendo-a”,
provavelmente no confessionário, da responsabilidade, sob a alegação de que, em
encarnação anterior, ela também fora traída.
Tivemos o
caso de uma jovem que se suicidara por uma paixão desvairada, numa antiga encarnação na Escócia, quando
aquele a quem amava abandonou-a, grávida e na vergonha. Localizando-o como
encarnado, perseguia-o, tentando — e conseguindo — induzi-lo a erros bastante
sérios.
Outra —
fora irmã de caridade — atormentava uma criatura encarnada, em cumprimento a
“ordens superiores”.
Vimos,
também, aquela pobre companheira, teleguiada por hábeis indutores, que
transviava um homem encarnado e era recompensada com festas, vestidos bonitos
e prazeres.
Em certa
oportunidade compareceu uma bem mais difícil. Já há algum tempo vinha tentando
induzir um dos componentes do grupo a uma atitude extremamente arriscada. O
caso era apresentado de maneira sutil, inteligente, como se fosse a coisa mais
natural do mundo. Seria apenas a antecipação do que, segundo o Espírito,
estava já programado para mais tarde. Não haveria culpa alguma, portanto. Era
“físicamente” simpática, apresentava-se bem vestida, unhas muito polidas,
sorridente, educada, cordial.
Várias
vezes tentou influenciar o nosso companheiro, apresentando-se ante seus olhos
espirituais, ou durante o desdobramento do sono natural. Finalmente, comparece
aos nossos trabalhos mediúnicos.
Ri-se,
muito divertida da situação. Tem a voz suave, envolvente e doce. Diz-se muito bela,
elegante, esguia, bem-cuidada. Conta casos, sorri, faz gestos graciosos e
parece imensamente segura de si mesma. Trata-me com condescendência e superioridade.
Informa que “trabalha” junto a casais e que seu objetivo é libertar a mulher,
para que todas sejam como ela, felizes e livres para gozar a vida, sem
preconceitos. De vez em quando, pára a exposição para rir, pois deixa entrever
que se decepcionou profundamente comigo. Conhecia-me apenas de nome e a
realidade não confere com a imagem que formulou a respeito da minha aparência.
Acha-me, provavelmente, feio, desengonçado e ridículo. Diz que no mundo em que
vive é muito poderosa, porque é a favorita. Ainda muito condescendente,
aconselha-me, como amiga, a juntar minhas coisas e partir enquanto é tempo,
pois não tenho a menor idéia do que estou fazendo e onde estou me metendo.
Esquiva-se habilmente às perguntas, muito segura, inteligente e tranqüila.
Quando lhe formulo questão mais complexa, desculpa-se, dizendo que é uma mulher
e não é dada à Filosofia.
Do mundo
espiritual, sugerem-me que lhe pergunte por que fugiu de um certo castelo
inglês. Ela continua a negacear, mas se mostra visivelmente transtornada. Por
fim, perde a calma, abandona a atitude de inconseqüente e superior
condescendência, e ordena-me autoritariamente que me sente, o que não quero
fazer, para permanecer junto do médium que a recebe.
É chegado
o momento de começar realmente o processo de doutrinação. Até aqui — o trabalho
todo durou cerca de uma hora — o tempo foi aplicado em tatear a sua
personalidade e os seus problemas, a fim de obter informações. Agora, já
dispomos de alguns elementos mais concretos. Digo-lhe, de início, que sua
beleza física, de que tanto se orgulha, é mera criação de sua mente, mas ela
está bem preparada para o confronto. Pede um espelho, para me provar que não
tenho razão. Nesse ponto, não obstante, vê junto dela um Espírito de aparência
agressiva e pejado de vibrações desarmonizadas. É um antigo esposo, de quem
ela matou todos os filhos recém-nascidos e os enterrou no jardim. Não queria
filhos, porque eles “deformam o corpo”. Está igualmente preparada para esse
encontro. Na organização em que vive, como favorita de um poderoso líder das
trevas, tudo aquilo lhe fora mostrado em retrospecto, por meio de imagens
vivas, em filme, para que ela pudesse, numa emergência como esta, suportar a
lembrança das suas próprias atrocidades, sem se perturbar e perder o
“equilíbrio”. Agora, enquanto revê as cenas, está aparentemente segura e coretinua
a rir-se de tudo, dizendo que não adianta mostrar-lhe nada. A despeito do seu
preparo, no entanto, não resiste muito tempo e entra em crise dolorosa, a pobre
e querida irmã. Seu ex-marido incorpora-se em outro médiuni e atira-lhe
impropérios, entre dentes, chamando-a de assassina. Diz-lhe que está à sua
espera e ri, de prazer insano, ante o desespero em que ela se precipita. Dirijo
a ele algumas palavras, tentando acalmá-lo, e me volto para ela, para ajudá-la
a enfrentar o seu problema, as suas recordações e, principalmente, o seu
futuro. Ela me responde em perfeito inglês:
-
1º burned all the bridges behind me. (Queimei todas as pontes por que passei.)
Respondo-lhe
que tentou também queimar as pontes para o futuro e, por isso, se sente
prisioneira numa ilha sinistra. É uma longa e penosa agonia! Sente as mãos
sujas de sangue, detesta aquele vestido vermelho, que não consegue trocar, e
começa a temer o momento fatal em que terá de deixar o médium para enfrentar a
nova realidade que se pastou diante dela subitamente, mas, por certo, não
inesperadamente. Elà pressente as dores que a esperam, pois muitas vezes deve
ter presenciado esse momento dramático, em outros Espíritos
endívidados. De repente, começa nela um fulminante processo de envelhecimento,
ao mesmo tempo em que suas roupas apresentam-se sujas e em frangalhos. Ela
ainda consegue dizer que seu ventre secou e, por fim, desprende-se com enorme
sofrimento para o médium, que ficou com os resíduos da sua profunda e dolorosa
angústia.
Poucas semanas depois deste caso, tivemos
outra manifestação de Espírito feminino. Também é das que se dizem atraentes e
sedutoras, estando, obviamente, empenhada em fascinar criaturas encarnadas e
desencarnadas, a serviço dos seus mandantes. Vai logo dizendo, muito
sorridente, que não venha com as minhas conversas macias. Ainda se fossem
outras conversas... diz, maliciosamente. Declara-se muito sutil e por isso é
destacada para missões delicadas. Teria descoberto que o pobre doutrinador é
muito amado e teve o desejo de conhecê-lo pessoalmente; no entanto, mal pode
esconder seu desapontamento. Presa aos seus condicionamentos, esperava, por
certo, que eu fosse jovem e belo, e não um desenxabido senhor de cabeça a
branquear. Digo-lhe que realmente sou um velho sem graça e quando lhe pergunto
se ela é jovem, responde corretamente que o Espírito não tem idade. A uma outra
pergunta minha, declara que vive no céu, pois o céu é um estado de espírito e
ela é muito feliz. A conversa prolonga-se aparentemente sem rumo, mas é a fase
em que são colhidas as informações de que necessitamos para o trabalho real de
doutrinação.
Depois de
reunidos os elementos que me parecem suficientes, proponho-me a orar. Ela
protesta, alegando que eu oro demais e, mal me levanto, ela se debruça sobre a
mesa, em pranto, numa crise emocionante, dolorosa. Sinto por ela uma infinita e
paternal ternura e lhe falo com muito carinho. Ela deixa cair todas as guardas
e me conta que é uma infeliz: foi explorada pelos homens aqui, na carne, e
continua a ser explorada do lado de lá. Vive num verdadeiro campo de
concentração, com outras criaturas infelizes. Enquanto “ela” estava lá —
refere-se, como depois apuramos, à irmã atendida semanas antes e que
descobrimos ter sido uma duquesa — foi protegida; depois, não. Havia sido
incumbida de uma tarefa, junto à esposa de alguém que estávamos interessados em
ajudar; mas, ao chegar junto a essa pobre senhora, viu-a em pranto, a chorar às
escondidas. Teve pena dela e ficou sem coragem de executar friamente o seu
mandato.
(Estava
presente também quando telefonei para essa amiga encarnada, para consolá-la de
dores que me havia confiado.) Aproveito para dizer-lhe que foi aquele momento
de compaixão, diante da sua vítima em perspectiva, que a salvou, permitindo que
fosse, por sua vez, socorrida. Sente-se muito desconcertada e arrependida de
ter-me tratado como tratou, de início. Quando lhe digo que tenho idade para
ser seu pai, ela me interrompe para afirmar que não teve a intenção de me
ofender: Como estou, precisamente naquela noite, comemorando 56 anos de idade,
digo-lhe que ela acaba de me dar o mais lindo presente: seu coração. Ela teme
seus verdugos e está apavorada ante as perspectivas de ser arrastada por eles,
ao deixar o médium. Sente-se muito emocionada ante o carinho e o respeito com que
a tratamos, se diz cansada e confessa que até aos meus prejudicou bastante, em
suas atividades, Vê, agora, ao seu lado, uma jovem pacificada e tranqüila, que
veio recebê-la, mas um dos emissários da sua tenebrosa organização está
presente, em outro médium, e tenta confundi-la, dizendo que a moça que a
espera também é deles, o que não é verdade. Pergunto se ela confia em mim. Diz que sim.
Peço-lhe que siga a moça, e ela parte, repetindo uma pequena prece que lhe
sugiro:
— Jesus, me ajude!
Houve,
neste caso, um pós-escrito. O companheiro que se incorporou em outro médium,
para ameaçá-la, perguntou se eu ainda dispunha de tempo para atendê-lo.
Respondi-lhe que, infelizmente, não, porque tínhamos uma disciplina de
trabalho, que precisava ser obedecida, mas poderíamos conversar na oportunidade
seguinte, com o que ele concordou, dizendo que voltaria. No decorrer da semana,
porém, nossos mentores disseram-nos que ele havia sido doutrinado no mundo
espiritual mesmo, e que se esclarecera, não sendo, portanto, necessário
trazê-lo novamente ao grupo.
*
São essas algumas experiências com
Espíritos ditos femininos. As vezes, elas são obsessoras implacáveis, tão
violentas e agressivas como os homens, tão irracionais quanto eles, nas suas
paixões e no desejo insaciável de vingança; mas são estatisticamente em número
reduzido, em relação aos Espíritos masculinos e, decididamente, mais abertas
ao entendimento e predispostas ao despertamento, porque mais sensíveis ao
apelo da ternura, da emoção, do respeito à sua condição feminina, ainda que
estejam transitoriamente numa posição de aviltamento, ou, talvez, por isso
mesmo. Ao sentirem que são tratadas como seres humanos, reagem como seres
humanos, respondendo, mais cedo ou mais tarde, às vibrações da nossa afeição.
O mais comum, porém, em trabalhos mediúnicos, é
encontrar mulheres que vêm recolher nos seus braços amorosos os companheiros
recém-despertos. São velhos e seculares amores: mães, esposas, filhas, irmãs,
que guardaram ternuras profundas, alimentadas em esperanças que nunca se
apagaram, nem mesmo esmoreceram. Comparecem, às vezes, ainda enoveladas, elas
próprias, em resgates dolorosos, mas quase sempre já mais avançadas no caminho
da pacificação. Algumas encontram-se de há muito revestidas de luz e harmonia.
Um destes casos, intensamente dramático, está relatado por André Luiz, em
“Libertação”. Matilde desce aos subterrâneos da dor, para resgatar o seu amado
Gregório, que se transviara lamentavelmente, e é com o seu amor apenas — e é
tudo! — que enfrenta a sua cólera, numa cena inesquecível.