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4 de mar. de 2012

Diálogo com as Sombras 1ª PARTE (1) - Formação do Grupo Mediúnico





PRIMEIRA PARTE
A INSTRUMENTAÇÃO


1
O GRUPO

          Voltemos às perguntas formuladas na Introdução.
          Em primeiro lugar, o preparo, que consiste na educação e na instrução dos componentes do grupo que se planeja, nos leva a outro quesito preliminar: — quem devem ser os componentes?
          A tarefa começa, pois, com a seleção das pessoas que deverão participar dos trabalhos. Como todo grupamento humano, este também deve ter alguém que assuma a posição de coordenador, de condutor. É preciso, não obstante, muita atenção e vigilância desde esta primeira hora. Esse motivador, ou iniciador, não poderá fugir de certa posição de liderança, mas é necessário não esquecer nunca de que tal condição não confere a ninguém poderes ditatoriais e arbitrários sobre o grupo. Por outro lado, o líder, ou dirigente, terá que dispor de certa dose de autoridade, exercida por con­senso geral, para disciplinação e harmonização do grupo. Liderar é coordenar esforços, não impor condições. O líder natural e es­pontâneo é aceito também com naturalidade e espontaneidade, sem declarar-se tal. É até possível que, nos trabalhos preliminares de organização do grupo, surja a sutil faculdade da liderança em pessoas nas quais mais inesperada ela parecia. Nestas condições, aquele que iniciou a idéia deve ter grandeza suficiente para reconhecer que o outro, que revelou melhores disposições, está mais indicado para a função do que ele próprio. Num grupo espírita, todos são de igual importância.
          O problema das rivalidades é tão antigo como a própria me­diunidade. O apóstolo Paulo tratou dele, na sua notável Primeira Epístola aos Coríntios, capítulos 12, 13 e 14, e, especificamente, nos versículos 4 a 30 do capítulo 12. (1)
O primeiro passo, portanto, que deve dar alguém que pretenda organizar um grupo mediúnico é selecionar as pessoas que irão com­po-lo. É bom que isto se faça mesmo antes de se decidir que tipo de trabalho será executado — do que falaremos mais adiante — e quem será incumbido da direção das tarefas. Os motivos são de fácil entendimento. Em primeiro lugar, o problema da liderança a que acima aludimos: é possível que a pessoa mais indicada para dirigir os trabalhos não seja aquela que se propõe, de início, a organizar o grupo, cumprindo-lhe provar, no decorrer das ges­tões preparatórias, a força tranqüila e segura da sua personalidade. Em segundo lugar, o grupo será a soma dos seus componentes, dis­porá das forças de cada um e terá como pontos fracos as fra­quezas dos seus participantes. Em terceiro lugar, a natureza dos trabalhos a serem programados dependerá dos diferentes tipos de mediunidade que for possível reunir, do grau de sensibilidade, tato, inteligência, conhecimento e evangelização de cada um e de todos, e da qualidade do relacionamento pessoal entre os que se propõem trabalhar juntos nesse campo.
Assim, não basta juntar alguns amigos e familiares, apagar a luz e aguardar as manifestações. Que amigos e familiares vamos se­lecionar? Essa tarefa é extremamente delicada e crítica, pois dela vai depender, em grande parte, o êxito ou fracasso do grupo. Será recomendável que a pessoa que pretenda fundar um grupo, mesmo de âmbito doméstico, de proporções modestas e sem gran­des ambições, guarde consigo mesma, por longo tempo, as suas intenções; que se entregue à prece constante, à meditação e ao estudo silencioso e demorado de cada pessoa; que examine, sem paixões e sem preferências, com toda a imparcialidade possível, as potencialidades de cada um, bem como os seus defeitos, vir­tudes, inclinações, tendências e temperamento. Não nos devem guiar aqui as preferências pessoais: — “Vou incluir Fulano ou Sicrana porque gosto dele ou dela.” É essencial que todos se esti­mem no grupo, mas só isto não basta. Podemos amar profunda­mente uma criatura que não ofereça condições mínimas para um

(1)       Seria oportuna, sob este aspecto, a leitura do artigo “O Livro dos Médiuns de Paulo, o Apóstolo”, em “Reformador” de fevereiro de 1974.

trabalho tão sério como esse. É claro, por outro lado, que não éaconselhável incluir aqueles que, embora ofereçam outras condi­ções favoráveis, se coloquem na posição de adversários e críticos demolidores de qualquer outro componente do grupo. Até a dis­cordância ideológica acentuada, mesmo em outros setores do pen­samento, pode criar dificuldades ao trabalho. Isto não quer dizer que todos tenham que pensar igualzinho, ou se transformarem em criaturas invertebradas, sem idéias próprias, sem personalidade e opinião. A franqueza é também um dos ingredientes necessários ao bom trabalho, desde que não alcance os estágios da rudeza que fere, mas a homogeneização dos ideais e das aspirações é con­dição importante para o bom entendimento que precisa prevalecer durante todo o tempo. Um só membro que desafine dessa atmos­fera de harmonia, poderá transformar-se em brecha por onde espí­ritos desajustados introduzirão sutilmente fatores de perturbação e eventual desintegração do grupo.
É preciso entender, logo de início, que os componentes encar­nados de um grupo são apenas a sua parte visível, O papel que lhes cabe é importante, por certo, mas nada se compara com as complexidades do trabalho que se desenrola do outro lado da vida, entre os desencarnados. Lá é que se realiza a parte mais crítica e delicada das responsabilidades atribuidas a qualquer grupo mediúnico, desde o cuidadoso planejamento das tarefas até a sua rea­lização no plano físico, no tempo certo. Os componentes encar­nados já fazem bastante quando não atrapalham, não perturbam, não interferem negativamente. É óbvio que ajudam de maneira decisiva, quando se portam com dignidade, em perfeita harmonia com o grupo; mas se não puderem ajudar, que pelo menos não dificultem as coisas. É melhor, por isso, recusar, logo de princípio, um participante em perspectiva, sobre o qual tenhamos algu­mas dúvidas mais sérias, do que sermos constrangidos, depois, a dizer-lhe que, infelizmente, tem que deixar o grupo, por não se estar adaptando às condições exigidas pelo trabalho.
É por isso que se recomenda uma longa meditação antes de decidir quanto à composição humana do grupo, para não fazermos o convite senão àqueles dos quais podemos contar com um mínimo de compreensão, entendimento e entrosamento com os demais.
Isto nos leva a uma outra questão, que deve ser logo decidida:
Quantos componentes encarnados deve ter um grupo? A experiência recomenda que os grupos não devem ser muito grandes, pois, quanto maiores, mais difícil mantê-los em clima de disciplina e harmonia. Léon Denis, em seu livro “No Invisível”, sugere de quatro a oito pessoas. O grupo pode funcionar bem até com duas pessoas, pois, segundo a palavra do Cristo, bastará que dois ou mais se reúnam em seu nome, para que Ele aí esteja.
É claro, porém, que um grupo muito pequeno tem suas possi­bilidades também limitadas. No caso de apenas dois, por exemplo, um teria que ser o médium e o outro o doutrinador, e o médium não teria condições de prolongar o trabalho sem grande desgaste psíquico, mas é certo que, mesmo assim, alguma coisa séria po­deria ser realizada. Acima dos oito componentes sugeridos por Denis, vai-se tornando mais difícil a tarefa, não apenas do dirigente encar­nado do grupo, como de seus orientadores invisíveis, porque a equipe se torna mais heterogénea, o pensamento divaga, quebra-se com freqüência o esforço de concentração, e o prejuízo é certo para a tarefa. É possível, no entanto, se alcançada impecável homogeneização, fazer funcionar razoavelmente bem um grupo com mais de oito pessoas, mas acima de doze vai-se tornando bastante problemática a sua eficácia.
É bom começar sem grandes ambições ou planos grandiosos. O mais certo é que, ao se planejar a instalação de um grupo, ainda não saibamos quanto à intenção dos espíritos que nos são fami­liares, nem quanto à natureza dos trabalhos que pretendem rea­lizar conosco. É certo, porém, que, sempre que um grupo se dispõe a reunir-se, com a finalidade de entrar em contacto com os desen­carnados, estes se apresentarão no momento oportuno. Isto é vá­lido, tanto para os que se dedicam, com seriedade e boas intenções, quanto para aqueles outros que se reúnem para se divertirem ou, pior ainda, para práticas condenáveis. Se a intenção é apenas fazer passar o tempo, virão os espíritos levianos, galhofeiros, fúteis e inconseqüentes, quando não claramente mal-intencionados, do que poderão resultar obsessões penosas e tenazes.
E, assim, chegamos a outro aspecto da questão: Para que de­sejamos um grupo? Para simples estudo da Doutrina? Para con­versar sobre Espiritismo? Para oferecer condições à manifestação de espíritos familiares, que venham trazer pequenas mensagens, mais ou menos íntimas? Para experimentação e observação de na tureza cientifica? Para tarefas mais sérias, de caráter doutrinário? Para os chamados trabalhos de desobsessão?
Esse ponto somente pode ser decidido, em definitivo, depois que tivermos selecionado os companheiros encarnados que vão compor a equipe. Por isso, logo que tenhamos resolvido, no silên­cio da meditação e da prece, de que nomes deveremos cogitar para a composição do grupo, convém convocar uma reunião, para exame e debate das inúmeras questões que começam a colocar-se.
Essa reunião, obviamente não mediúnica, para a qual deverão ser convidados aqueles cujos nomes foram lembrados para uma consulta, será aberta com a leitura de um texto evangélico e uma prece. Em seguida, aquele que tomou a iniciativa de con­vocá-la fará uma breve exposição de seus objetivos e intenções.
A reunião será conduzida com descontração e espontaneidade, à medida que cada um apresentar sua contribuição ao debate. Serão arrolados os médiuns presentes, já atuantes, e os que tenham potencial mediúnico suscetível de desenvolvimento.
Não está previsto no escopo deste livro um estudo sobre o desenvolvimento da mediunidade, pois o assunto, bastante complexo, tem sido tratado em várias obras de confiança, especialmente em “O Livro dos Médiuns”, de Allan Kardec. Léon Denis também ofe­rece contribuição valiosa, não só em “No Invisível”, mas, também, em outras de suas obras. Recomenda-se, ainda, André Luiz, em “Mecanismos da Mediunidade”, “Nos Domínios da Mediunidade” e “Libertação”, bem como o livro interpretativo de Martins Peralva “Estudando a Mediunidade”, todos editados pela Federação Espí­rita Brasileira.
Creio oportuno acrescentar que esses livros não se dedicam especificamente a ensinar como desenvolver a mediunidade, e, sim, a apresentar um panorama, tão abrangente quanto possível, dos di­versos aspectos dessa notável faculdade humana, muito mais comum do que tanta gente estaria disposta a admitir.
Não há fórmulas mágicas, nem ritos especiais para fazer eclodir a mediunidade numa pessoa que a tenha em potencial.
O desenvolvimento mediúnico é trabalho delicado, difícil e muito importante, que exige conhecimento doutrinário, capacidade de observação, vigilância, tato, firmeza e muita sensibilidade para identificar desvios e desajustes que precisam ser prontamente cor rigidos, para não levarem o futuro médium a vícios funcionais e até mesmo a perturbações emocionais de problemática recuperação.
No passado remoto, esse encargo era de caráter iniciático. O instrutor ia dosando seus ensinamentos segundo as forças e a re­ceptividade do discípulo, e este somente chegava aos estudos mais avançados de desenvolvimento de suas faculdades se ao longo do processo viesse demonstrando, sistematicamente, as condições mí­nimas exigidas para a tarefa a que se propunha.
Evidentemente não há, hoje, necessidade de um guru que leve o discípulo, por estágios sucessivos, até o ponto ideal. O Espiritismo desmistificou o antigo ocultismo, tornando o conhecimento básico acessível ao homem comum. Não nos esqueçamos, no entanto, de que a técnica do desenvolvimento mediúnico ainda exige atenção, acompanhamento e orientação pessoal de alguém que tenha condi­ções morais e doutrinárias para fazê-lo. A mediunidade, salvo casos especiais, não deve ser desenvolvida isoladamente e sem apoio dos livros essenciais ao entendimento dos seus componentes básicos.
Colocado num grupo harmonioso e bem assistido, em que fun­cionem médiuns bem disciplinados e já em plena atividade, épossível ao médium incipiente desenvolver, pouco a pouco, suas faculdades. O dirigente do grupo deve manter-se atento a essa possibilidade. De forma alguma, porém, o treinamento mediúnico deve ser intentado com base em obras suspeitas ou organizações que prometam resultados prontos e maravilhosos em algumas lições. É também uma imprudéncia forçar o desenvolvimento sem nenhuma preocupação de estudar a questão nos livros que compõem a Codi­ficação de Kardec e a obra complementar de seus continuadores.

*

Após esta digressão acerca do desenvolvimento mediúnico, vol­temos ao assunto em foco.
Ao cabo de algumas reuniões de debate e ajustamento, o perfil do grupo que se pretende implantar já deve estar suficientemente definido. Qualquer que seja a natureza do seu trabalho — estudo, pesquisa, experimentação, desobsessão — não deve iniciar suas ta­refas especificas senão ao cabo de um aprendizado mais ou menos longo das questões doutrinárias. Mesmo que os componentes da futura equipe se julguem suficientemente informados e conhece dores da Doutrina dos Espíritos, vale a pena uma revisão geral. Embora não gostemos de admitir, nosso conhecimento é menor do que pensamos. Ademais, é difícil reunir um grupo de pessoas — seis ou oito — que conheçam igualmente, e em profundidade, todas as obras essenciais à tarefa a que se propõem. O mais provável éque o grupo se componha de gente em diferentes estágios de conhecimento, desde aquele que tem apenas vagas noções, até o que já possui conhecimentos mais profundos. Será útil para todos um período de atualização de conhecimentos, a começar, natural­mente, pelo “O Livro dos Espíritos”, seguido de “O Livro dos Médiuns”.
Para não prolongar demasiadamente este período de revisão, deve ser dada prioridade à “Parte Segunda” de “O Livro dos Espíritos”, que cuida “Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos”, e à Segunda Parte de “O Livro dos Médiuns”, a partir do ca­pítulo 14 — “Dos Médiuns”.
A duração e freqüência das reuniões de estudo serão objeto de debate e ajuste entre os componentes. Não é preciso fazer a leitura de cada capítulo no decorrer das reuniões, desde que todos o tenham estudado, segundo a programação acordada, durante o período que vai de uma reunião à seguinte. A reunião se destina à verificação do progresso que cada um realiza na revisão, e ao debate e esclarecimento das dúvidas surgidas. Seu objetivo final será sempre o de homogeneizar os diversos graus de conhecimento doutrinário, para obter a integração do grupo.
Não deve subsistir nenhuma preocupação com o tempo des­pendido nesse trabalho preparatório, que poderá ser mais longo ou mais curto, segundo o grau de conhecimento dos seus componen­tes, a boa-vontade e a dedicação de cada um.
Por algum tempo, até que se consiga alcançar uma fase de melhor preparo doutrinário, torna-se aconselhável serem evitadas as manifestações mediúnicas, mesmo que haja no grupo médiuns já desenvolvidos. De certo ponto em diante — e isto fica a critério daquele que se responsabiliza por esta fase dos trabalhos — as tarefas mediúnicas poderão ser iniciadas em paralelo com as de estudo. Nesse caso, o estudo precederá as manifestações e deverá, ainda por algum tempo, que poderá ser longo, ocupar boa parte do horário.
Nunca é demais enfatizar a importância e utilidade desta fase preparatória, pois não apenas os encarnados se beneficiam dela, como também os desencarnados que, certamente, começarão a ser trazidos pelos benfeitores espirituais, para aproveitarem os ensina­mentos ministrados. Esse período é, ainda, muito útil para afinar o grupo, ajustar seus vários componentes, revelar as tendências e potencialidades de cada um e, até mesmo, por um processo na­tural de seleção, excluir, sem atritos ou desgosto, aqueles que não se sentirem em condições de se entregar ao trabalho, que exige, certamente, renúncia, dedicação, assiduidade, tolerância, estudo e amor. Os impacientes deixarão o grupo espontaneamente, em pro­cesso de exclusão natural. Não que sejam impuros (por favor!), mas por ser melhor que abandonem a tarefa pela metade, do que insistirem em ficar, em prejuízo dos resultados. No primeiro caso, estariam prejudicando apenas a si mesmos; no segundo, sacrifica­riam todo o conjunto. Talvez em outra oportunidade, mais adi­ante, resolvam dedicar-se com maior entusiasmo e firmeza. Tarefas como essas não podem ser impostas, nem forçadas; têm que se apoiar num impulso interior, no desejo de servir, de apagar-se, se necessário, dentro da equipe, de modo que os resultados obtidos sejam impessoais, coletivos, não creditáveis exclusivamente ao tra­balho individual deste ou daquele componente do grupo. Quem não estiver disposto a aceitar essas condições não está preparado para o trabalho.
A essa altura, portanto, o grupo já deverá estar com o seu perfil suficientemente nítido. Já se sabe quais os que o compõem, quais são os médiuns, quem se revelou com melhores condições de liderança e tato na condução da equipe, e qual a natureza do trabalho a que esta deve dedicar-se, bem como a duração e fre­qüência das reuniões (sobre o que falaremos, ainda, em outro ponto deste livro).
É, então, chegado o momento de especificar a finalidade e os objetivos do grupo.
A primeira grande divisão consiste em saber se o grupo vai dedicar-se apenas a estudos ou a trabalhos experimentais. Não que uma coisa exclua a outra, mas a definição é importante porque, como diziam os antigos, quem navega sem destino não sabe aonde vai.
A natureza do trabalho pode variar bastante, segundo os inte­resses e inclinações de seus componentes, especialmente daqueles que se dedicam à organização da equipe. É possível que desejem apenas a experimentação de caráter puramente científico, com ên­fase na fenomenologia, o que seria uma tarefa quase de laboratório. Não há muito a dizer aqui sobre este aspecto, dado que o assunto escapa à minha área de competência e experiência.
Alguns grupos, desinteressados do aspecto prático, podem ser constituídos apenas para o estudo teórico da doutrina. Também são válidos, é claro. Outros podem combinar o estudo teórico com a experimentação científica ou mediúnica. Este livro está mais vol­tado para esta última opção, e é sobre ela que nos fixaremos.
Suponhamos, pois, que o grupo se resolva pelo trabalho de desobsessão.
Voltemos à imagem do filho. Já decidimos que desejamos o trabalho, já nos convencemos, após algum tempo de estudo teórico, de que estamos preparados para ele. Estamos igualmente dispos­tos aos sacrifícios e às renúncias que o trabalho impõe. A tarefa precisa ser desenvolvida com muita assiduidade e continuidade ininterrupta. Nem sempre estaremos físicamente dispostos a ela, em virtude do cansaço, das lutas naturais da vida diária, do des­gaste e das tensões provocados pela atividade profissional, dos inconvenientes oriundos de pequenas indisposições orgânicas.
O dia destinado à reunião exige renúncias diversas, pequena-nas, mas às quais nem sempre estamos acostumados: moderação e vigilância, por exemplo. Como os trabalhos são usualmente rea­lizados à noite, não podemos destiná-la ao convívio da família, aos passeios, às visitas, ao relaxamento, à leitura de livro recreativo ou à novela de televisão. É um dia de recolhimento íntimo, ao qual temos que nos habituar, aos poucos. Estamos cientes disso.
Da mesma forma, encontramo-nos perfeitamente conscientizados das responsabilidades que assumimos. Vamos nos defrontar com espíritos desajustados que, no desespero em que se precipitaram, voltam-se contra nós, muitas vezes sem razão alguma, senão a de que estamos tentando despertá-los para realidade extremamente dolorosa, da qual se escondem aflitivamente. A responsabilidade é grande, pois, e sabemos disso. Encontraremos percalços e nos em­penharemos em lutas remidas pelo bem. Mesmo assim, desejamos o grupo. Um pouco de humildade nos fará, aqui, um bem enorme.
Não planejamos um grupo para reformar o mundo, nem para con­quistar todos os grandes espíritos que se debatem nas sombras. Ha­veremos de nos preparar apenas para a nossa pequena oferenda. Os orientadores espirituais saberão o que fazer dela, porque, muito me­lhor do que nós, estão em condições de avaliar as nossas forças, recursos, possibilidades e intenções, bem como as nossas fraquezas. O planejamento é realizado no mundo espiritual. A nós, encarnados, caberá executá-lo, dentro das nossas limitações. De tudo isto esta­mos conscientes. Tudo isto aceitamos. Resta o compromisso do amor fraterno, que não pode ser parcial, condicionado, a meio coração, reservado; tem de ser total. Começa com o relacionamento entre os componentes do grupo, que precisa apoiar-se no perfeito entrosa­mento emocional de todos, para o que, obviamente, é indispensável que todos se estimem e se respeitem. Sem isso, impraticável seria doar o amor de que necessitam os irmãos desencarnados que nos procurarem, movidos pela esperança secreta de que os conquistemos para as alegrias do amor fraterno. É nessa oportunidade, que se renovará em todos os encontros, que colocaremos em prática aquele sábio ensino de Jesus, que nos recomenda amar os nossos inimigos. Muitos espíritos, em doloroso estado de desajuste emocional, se apresentarão, diante de nós, como verdadeiros inimigos, irritados, agressivos, a deblaterarem em altas vozes, indignados com a nossa interferência em seus afazeres. Sem aquele amor incondicional que nos recomendava o Cristo, como iremos oferecer-lhes a segurança da compreensão e da tolerância de que tanto necessitam?

*

Estão resolvidas, portanto, as preliminares. Temos o grupo montado e já definimos os seus objetivos. A próxima questão que se coloca é: onde e quando reuni-lo?
Consideremos primeiro a segunda parte. A freqüência as reu­niões é usualmente de uma vez por semana, à noite. Dificilmente um grupo terá condições de reunir-se regularmente, durante vários anos, mais de uma vez por semana. Todos ou quase todos os seus componentes têm compromissos sociais, familiares e até profissio­nais, que tornam impraticável reuniões mais freqüentes. A noite é escolhida justamente porque, a partir de certa hora, estão todos com as tarefas do dia concluidas. Uma boa sugestão seria reservar, para os trabalhos mediúnicos, a segunda-feira, a partir de 20 horas ou 20h30m, com duração máxima de duas horas. Justifique­mos a escolha da segunda-feira. Ê que ela sucede ao repouso mais longo do fim de semana, quando já tivemos a oportunidade de nos refazer das canseiras dos dias de atividade, tanto profissional quanto no próprio grupo. Isto é especialmente válido para os médiuns, nos quais o desgaste psíquico é sempre grande nos dias em que atuam.
O outro aspecto da questão diz respeito ao local. As sessões podem ser realizadas em casa ou convém buscar outro local, de preferência um centro, com acomodações especiais? Alguns confrades temem a realização de trabalhos de desobsessão em casa, com receio da influência negativa dos espíritos desarmonizados que são atraidos. A questão é delicada e não pode ser respondida suma­riamente, sim ou não. Há uma porção de condicionantes. Se for possível um local apropriado, num centro espírita bem orientado, o trabalho deve ser feito aí. Por outro lado, num lar tumultuado por disputas, rivalidades, ciúmes, paixões subalternas e desajus­tes de toda sorte, a realização de trabalhos de desobsessão poderá agravar as condições, pois será difícil aos companheiros desencar­nados, que orientam o grupo, assegurar um clima de equilíbrio e proteção, tanto para os espíritos trazidos para serem atendidos, como para as pessoas que vivem na casa. Num lar normal, porém, o trabalho mediúnico equilibrado e bem dirigido, sob a proteção de orientadores espirituais competentes e esclarecidos, pode funcionar sem problemas e até com benefícios para a vida doméstica.
Isto não exclui a necessidade de vigilância e atenta observa­ção, pois é evidente que espíritos infelicitados pela desarmonia interior tenderão sempre a transmitir sua perturbação àqueles aos quais tiverem acesso, ou seja, àqueles que deixarem cair suas guar­das, criando brechas por onde penetrem emissões negativas e inquie­tantes. Mas isto acontece, haja ou não haja grupo mediúnico reu­nido em casa. O que nos defende da investida de companheiros infelizes das sombras não é a realização de sessões bem distantes do local onde vivemos, é a prece, são as boas intenções, é o desejo de purificar-se, de aperfeiçoar-se, de servir. Para cobrar nossos com­promissos, os espíritos desajustados nos buscam em qualquer lugar, até nas profundezas de esconderijos mais abjetos na carne, ou nas furnas do mundo espiritual inferior.
Por outro lado — e isto vai dito com bastante pesar — nem todos os centros oferecem condições ideais para o difícil trabalho da desobsessão. Pode haver casos em que o ambiente psíquico de uma instituição esteja sob a influência de rivalidades, disputas in­ternas, questões de ordem material ou financeira, desorientações ou práticas que a Doutrina Espírita não endossa e até mesmo condena formalmente. Em tais condições, torna-se muito difícil um trabalho mediúnico sério e responsável. Os espíritos perturbadores poderão encontrar meios para neutralizar tarefas que se anunciam, de início, promissoras. Não quer isso dizer que não haja proteção e amparo por parte dos espíritos bem-intencionados que nos assistem, mas, em todo relacionamento com o mundo espiritual, há sempre a parte que compete a nós realizar. Essa, os Espíritos não a farão por nós. Seria o mesmo que mandar os filhos à escola e fazer por eles todos os deveres.
O que garante a estabilidade de um bom grupo mediúnico não é a sua localização física, geográfica; é o equilíbrio psíquico, emo­cional, daqueles que o comPõem. Em ambiente perturbado, no lar ou no centro, qualquer grupo torna-se vulnerável ao assédio cons­tante das vibrações negativas que cercam os seus componentes. Se na vida diária, sob condições perfeitamente normais, já somos tão assediados pelos cobradores invisíveis, é claro que podemos contar com um esforço muito maior deles, quando nos dedicamos à de­licada tarefa de interferir com as suas paixões, ódios e rancores.
Por outro lado, antigos comparsas de erros passados procuram sempre impedir que caminhemos pela senda áspera da recupera­ção, pois sabem que é com esses processos que nos redimimos e nos colocamos ao abrigo de suas investidas.
Nada de ilusões, pois. O trabalho de desobsessão não é fácil, qualquer que seja o ambiente em que se realize, e, por isso, não pode ser recomendado para um meio que, do ponto de vista humano, já se encontre tumultuado e desequilibrado.
O cômodo destinado às sessões deve ser escolhido com critério e extremo cuidado. Precisa ser suficientemente amplo e arejado, para acomodar bem todos os participantes. Deve ser isolado, tanto quanto possível, das demais dependências do prédio, sendo inadmis­sível, por exemplo, para essa finalidade, uma passagem obrigatória para aqueles que não participem dos trabalhos, como uma sala de entrada que dê para a rua. A qualquer momento, uma pessoa da casa ou um visitante inesperado estaria tocando a campainha ou batendo à porta, interrompendo o curso das atividades. O cômodo não deve ter telefones que possam tocar subitamente, causando choques e perturbações àqueles que se acham concentrados. Deve estar igualmente abrigado de ruídos de tráfego ou gritos vindos da rua, sons de televisão ou rádio ligados nas redondezas. Quando pos­sível, deve ser provido de um condicionador de ar, para as noites de verão intenso, dado que o mal-estar físico dos participantes dificulta sobremaneira o bom andamento dos trabalhos.
Mesmo nos demais dias da semana, a sala onde se realizam os trabalhos mediúnicos deverá ser preservada. Ë preciso evitar ali reuniões sociais, conversas descuidadas, visitas inconvenientes, atos reprováveis. O ambiente costuma ser mantido em elevado teor vibratório pelos trabalhadores espirituais, o que se nota, especial­mente nos dias de reunião, ao se penetrar no cômodo.
O ideal, portanto, é ter um compartimento destinado somente à tarefa mediúnica. Quando isso for impraticável, que pelo menos se tenha o cuidado de usá-lo apenas para atividades nobres, como a boa leitura, a música erudita, o preparo de artigos e livros dou­trinários, o estudo sério.
Essa recomendação é tão válida para a hipótese de se desen­volver o trabalho em casa, como no centro espírita. A proteção magnética da sala mediúnica deve ser preservada com todo o cuidado, para não viciar os dispositivos de segurança do trabalho, não perturbar a harmonia do ambiente, não interferir com os meticulo­sos preparativos realizados pelos companheiros desencarnados que dirigem e orientam as tarefas. Ademais, com freqüência, alguns espíritos em tratamento ficam ali em repouso, por algumas horas, de um dia para o outro, por exemplo, enquanto não são removidos para instituições apropriadas.
Quem não puder manter essas condições mínimas, em sua casa ou no centro, não deve tentar trabalho mediúnico de respon­sabilidade.
O ingresso na sala deve ser feito apenas minutos antes do início da sessão. A recepção dos componentes e a conversação inicial serão realizadas em outro cômodo, de vez que, por maior que seja o cuidado, pode escapar um pensamento impróprio ou uma expressão infeliz, numa conversa descontraída, especialmente porque, após o espaço de uma semana, que usualmente vai de uma reunião à outra, quase todos gostam de relatar experiências e acon­tecimentos. Torna-se, dessa maneira, mais difícil manter um clima de absoluta vigilância. Com freqüência, os espíritos nos demons­tram, depois, no decorrer dos trabalhos, que se achavam presentes à conversação prévia. Sempre que a conversa descamba para assun­tos menos nobres, eles fazem uma advertência amiga, pedindo que fiquemos nos temas de caráter doutrinário ou, pelo menos, em con­versa neutra. Quer isto dizer que são proscritos dessas conversa­ções prévias, por motivos mais que óbvios, os comentários sobre o crime da semana, sobre o último casamento do astro da novela, a piada do dia, ou a derrota do nosso time de futebol.
Em lugar desses assuntos, que deixaremos para as frívolas reu­niões sociais, a temática pode perfeitamente girar em torno de ques­tões doutrinárias. Uma boa sugestão é a de recapitular a semana, naquilo que pode contribuir para ajudar o desenvolvimento do trabalho.
Freqüentemente, os médiuns e outros participantes têm sonhos, recebem intuições ou pequenos avisos e conselhos de Espíritos amigos, ou têm a relatar contactos mantidos, em desdobramento, com mentores do grupo ou com os companheiros que estão sendo tratados ou que ainda virão a manifestar-se. Essa técnica se desen­volve com o tempo. Depois que todos os componentes do grupo forem alertados para as suas possibilidades e vantagens, passam a observar com maior atenção os acontecimentos e anotar sonhos, intuições e “recados” do mundo espiritual. É evidente que esse material deve ser examinado e criticado com extremo cuidado, para que o grupo não se embrenhe pela fantasia.
A experiência do pequeno grupo do qual faço parte tem sido bastante positiva neste particular. De modo geral, os “sonhos”, que são verdadeiros desdobramentos, trazem informações valiosas, que os espíritos em tratamento posteriormente confirmam, no decorrer do diálogo mantido com o doutrinador.
Geralmente, esses contactos são preliminares ao trabalho, ini­ciado no mundo espiritual, antes que a manifestação se torne os­tensiva no grupo mediúnico. O tema é tratado mais amplamente em outro ponto deste livro.

*

Minutos antes de iniciar a sessão, todos se dirigirão, em silên­cio, ao cômodo destinado aos trabalhos, e se sentarão em torno da mesa. Cessaram, a essa altura, todas as conversas. Aquietam-se as mentes, tranqüilizam-se os corações, desligam-se das preocupações do dia, relaxam os músculos, e todos se predispõem ao trabalho.
A essa altura, a sala já está preparada pelos responsáveis espi­rituais. No grupo do qual faço parte, um dos médiuns viu, mais tarde, depois de recolhido ao leito, em retrospecto, toda a sessão, desde o preparo da sala. Neste caso, o cômodo destinado às reu­niões fica completamente isolado do corpo da casa, tendo acesso apenas por uma passagem externa. Cerca de duas horas antes, a sala está preparada físicamente para a reunião: mesa e cadeiras em posição, a água destinada à fluidificação, os livros que contêm os textos destinados à leitura, material para eventual psicografia, papel, lápis, canetas esferográficas, o caderno de preces, o gra­vador com a fita já também em posição para captar a mensagem final dos mentores do grupo, uma pequena luz indireta, preferenternente de cor, pois a luz branca é prejudicial a certos fenômenos mediúnicos. Sugere-se a cor vermelha.
Depois de todos esses preparativos, os trabalhadores do mundo espiritual, segundo viu o nosso médium, em retrospecto, inspecio­nam o cômodo, dando voltas em torno da mesa e providenciando para que fossem estabelecidas certas “ligações” com o plano supe­rior, através de aparelhos e “fios” luminosos que se prendiam às cadeiras de cada membro. Esta é a razão pela qual cada um deve ter seu lugar fixo em torno da mesa, uma vez que os dispositivos ligados às cadeiras se destinam a fácilitar o trabalho, atendendo a características específicas de suas mediunidades, bem como às condições do espírito que será trazido para tratamento.
Outra recomendação, que parece útil, a esta altura, ainda com relação à distribuição do pessoal em torno da mesa: sempre que possível, o dirigente deve sentar-se de forma a ficar ao lado dos médiuns e não face a face. Este conselho é ditado pela boa téc­nica de reuniões profanas, que recomenda que duas ou mais pessoas, que vão debater um assunto, não devem defrontar-se, para não exacerbar o antagonismo. A razão é puramente subjetiva e psicológica. É mais fácil, a qualquer um de nós, alcançar um entendimento com uma pessoa ao nosso lado, do que se ela estiver exatamente diante de nós. A posição frente a frente parece le­vantar em nós os resíduos e os depósitos acumulados pelos milênios em que enfrentávamos nossos adversários em lutas pela sobre­vivência. No caso das sessões mediúnicas, o objetivo não é disputar uma peleja de vida ou morte, mas dialogar amistosamente com um Espírito em estado de confusão e desespero, que desejamos des­pertar para uma realidade que ele se recusa tenazmente a aceitar. Se opomos, à sua agressividade, a nossa, nada conseguiremos. Tudo deve ser feito, pois, para eliminar qualquer empecilho que possa existir entre o comunicante e o doutrinador.
Antes de prosseguir, façamos uma revisão geral na sala.
Os móveis estão na posição certa e os lugares predeterminados. Todos devem ocupar os assentos em silêncio, sem fazer alarido e arrastamento ruidoso de cadeiras. Se há trabalhos de psicografia, o material correspondente deve achar-se sobre a mesa: papel em folhas soltas, vários lápis apontados e esferográficas, num copo ou outro recipiente apropriado. Se os trabalhos forem mistos, ou seja, de psicografia e incorporação, convém que o material não fique ao alcance dos médiuns de incorporação, pois um espírito mais turbulento pode, num gesto brusco, atirar os objetos ao chão. Se há psicografia, quem ficar ao lado do médium deve estar pre­parado para remover as folhas, à medida que são escritas.
O caderno de preces destina-se a receber o nome dos encar­nados e desencarnados para os quais desejamos solicitar ajuda espiritual. Os nomes devem ser escritos antes de começar a sessão, sempre em silêncio, sem comentários. Pode ser adotado o processo de indicar com um pequeno sinal, em forma de cruz, os nomes das pessoas desencarnadas. Na hora da prece, serão mentalizados pelos interessados.
Lá está, igualmente, sobre a mesa, o livro que contém o ma­terial de leitura preparatória, geralmente uma obra mediúnica assinada por Emmanuel — “Vinha de Luz”, “Pão Nosso”, “Fonte Viva” —, ou por outro autor da preferência do grupo.
A água destinada a ser fluidificada deve estar num jarro de vidro, juntamente com pequenos copos, de preferência ao lado da mesa, para que, num movimento mais violento, não sejam atirados ao chão. Não convém que a água esteja gelada: um amigo espiritual nos disse, certa vez, que a água à temperatura normal do ambiente se prestava mais facilmente à fluidificação ou magnetização.
Quanto ao gravador de som, deve estar pronto para entrar em ação com o mínimo de operações e ruídos: a fita em posição, mi­crofone já anteriormente testado, de preferência posto sobre um móvel ao lado da mesa principal. Se emitir luz intensa de algum visor, este deve ser coberto com um objeto opaco. No momento oportuno, bastará dar a partida. É conveniente, ao testá-lo, gravar a data da sessão. No grupo que freqüentamos, o gravador é reser­vado para a mensagem final, usualmente transmitida depois do atendimento dos companheiros necessitados. Essas mensagens, acumuladas ao longo do tempo, constituirão precioso repositório de ensinamentos e de experiência no trato com os problemas do mundo espiritual, e devem ser preservadas para referência futura.
Todos se encontram, assim, a postos.
As sugestões oferecidas a seguir não são, obviamente, man­damentais, pois cada grupo acaba por encontrar a sua dinâmica própria, dentro do roteiro mais ou menos comum a esse tipo de trabalho. Proporemos, aqui, um roteiro típico, que pode, evidente­mente, sofrer variações, a critério de cada grupo.
Depois de todos acomodados e em silêncio, é feita a leitura do texto do dia, geralmente, em seqüência, ou seja, um para cada sessão. (A data da sessão deverá ser anotada ao pé da página.) Alguns grupos costumam comentar o texto lido; tais comentários não devem ser muito longos, nem elaborados, nem guardar tom ora­tório: serão singelos e sem retórica bombástica.
Em seguida, a luz mais intensa é apagada, restando apenas a lâmpada mais fraca, que forneça iluminação discreta, de preferên­cia em cor suave, indireta, apenas suficiente para se distinguir o ambiente, as pessoas e os objetos. Convém retirar, neste momento, os objetos que se encontrem sobre a mesa, pelas razões já apre­sentadas.
É feita a prece, que também não deve ser longa, nem deco­rada, ou em tom de discurso: uma rogativa simples, na qual se solicite a proteção para os trabalhos, a colaboração dos amigos espi­rituais, a inspiração e a predisposição para receber os companheiros aflitos com amor, tolerância e compreensão.
Finda a prece, todos ficam recolhidos, em silêncio, concentrados, atentos, mas em estado de tranqüilidade e relaxamento muscular.
Em alguns grupos, o dirigente encarnado dos trabalhos, ou o mentor espiritual, costuma designar previamente os médiuns que irão atuar, fixando-lhes até o número de Espíritos que deverão atender, bem como os médiuns que não deverão “dar passividade” a nenhum manifestante. Embora se trate de uma posição respei­tável e bem-intencionada, com o propósito aparente de disciplinar as atividades do grupo, não é recomendável o procedimento.
Procurarei apresentar as razões.
A designação prévia do médium pode criar neste uma expec­tativa, e até certa ansiedade, que o leve a “forçar” uma comuni­cação, e até mesmo levá-lo ao fenômeno do animismo, se não estiver bem preparado para a sua tarefa e habituado ao exercício da me­diunidade vigilante. Não convém correr esse risco, pois nem todos os grupos estariam preparados para identificar a dificuldade e corrigi-la. Por outro lado, não conhecemos, com precisão, o plane­jamento realizado no mundo espiritual. É bem possível que con­venha encaminhar primeiro determinado Espírito, por determinado médium; e se, por desconhecimento, designamos outro médium, altera-se a seqüência do trabalho programado, o que acarretará adaptações de última hora, que vão sobrecarregar os companheiros desencarnados. É que os Espíritos a serem tratados encontram-se ali, no ambiente, e muitas vezes, depois de presenciarem um aten­dimento particularmente dramático ou tocante, o próximo compa­nheiro já vem predisposto e mais receptivo à doutrinação. Os men­tores do grupo conhecem bem esse mecanismo e sabem melhor como dispor as manifestações.
Acresce ainda uma observação- Acreditam alguns que esse pro­cesso de designar cada médium, de uma vez, evita que todos sejam tomados ao mesmo tempo e se crie balbúrdia prejudicial ao tra­balho. Na minha experiência pessoal, nunca encontrei essa difi­culdade. É freqüente verificarmos que outros médiuns já se acham ligados aos próximos manifestantes, mas, num grupo bem ajustado, os mentores terão recursos suficientes para contê-los, até que chegue a vez de falarem.
Em suma: a seqüência da apresentação dos desencarnados e a escolha dos médiuns, que irão atuar ou não, devem ficar a critério dos dirigentes espirituais do grupo, que não têm necessidade de anunciar-nos previamente o plano de trabalho da noite, para que ele se desenrole harmoniosamente. Pelo contrário, quanto menos interferirmos, melhor.
É excusado dizer que a sessão deve ter hora prefixada para começar e para terminar. Os companheiros necessitados devem ser atendidos rigorosamente dentro do horário a eles destinado. Em hipótese alguma deve permitir-se que, por iniciativa dos manifes­tantes, ou não, seja ultrapassada a hora. Certa vez, tivemos a esse respeito uma lição preciosa. Percebendo que a hora se esgotava, o espírito manifestante, muito ardilosamente, começou a manobrar para ganhar tempo. Quando o dirigente lhe disse que precisava partir, ele apelou para a boa educação:
— Você está me mandando embora?
E com essas e outras, o diálogo ainda se alongou por alguns minutos. Terminado o atendimento, um dos orientadores recomen­dou-nos, em termos inequívocos, que evitássemos a repetição do ocorrido. Explicou que o trabalho mediúnico é protegido e assis­tido por uma equipe de segurança, composta de obreiros do lado de lá. Esgotado o prazo, eles têm que se retirar, de vez que outras tarefas inadiáveis os aguardam alhures, e o mecanismo de segurança fica substancialmente enfraquecido. Os espíritos turbu­lentos, sabendo disso, procuram demorar-se, para provocar distúr­bios e levar o pânico ao grupo, o que seria desastroso. A lição é importante.
Terminado o atendimento, enquanto se aguarda a palavra final dos mentores, há uma pausa, que deve ser usada para uma pe­quena prece, que ajuda a repor o ambiente em termos mais calmos, depois das várias manifestações de companheiros aflitos, às vezes barulhentas e indignadas.
Concluída a mensagem final, que, como vimos, convém gravar, para futura referência e estudo, os trabalhos são encerrados com uma prece.
É hora dos comentários finais.

*

Há sempre o que comentar, após uma sessão mediúnica. Épreciso, no entanto, que tais comentários obedeçam a uma disci­plina, para que possam ser úteis a todos. É que, usualmente, os Espíritos atendidos ainda permanecem, por algum tempo, no re­cinto. Seria desastroso que um comentário descaridoso fosse feito, em total dissonância com as palavras de amor fraterno que há pouco foram ditas, pelo dirigente, durante a doutrinação. Os ma­nifestantes, no estado de confusão mental em que se encontram, tudo fazem para permanecer como estão. Embora inconscientemente desejem ser convencidos da verdade, lutam desesperadamente para continuar a crer ou a descrer naquilo que lhes parece indicado. Se percebem que toda aquela atitude de respeito, recolhimento  e carinho é insincera, dificilmente poderão ser ajudados de outra vez.
Por isso, dizia que os comentários devem ser disciplinados. O dirigente deve perguntar pela experiência de cada um. Os médiuns videntes sempre têm algo a dizer, pois percebem a presença desta ou daquela entidade, ou têm acesso a fenômenos que usualmente interessam ao bom andamento dos trabalhos ou trazem indicações a serem utilizadas na sessão seguinte. Se o dirigente não dispõe do recurso da vidência, os médiuns videntes do grupo devem ajudá-lo discretamente, com o mínimo de interferência, durante os trabalhos. O mesmo se aplica aos médiuns clariaudientes. Os comentários finais não devem prolongar-se por muito tempo. Geralmente, ao terminar a sessão, é tarde da noite, e os componentes do grupo, especialmente os que moram longe, precisam retirar-se, pois o tra­balho os espera pela manhã do dia seguinte, com as suas lutas e canseiras.
Mesmo que a sessão tenha terminado, o comportamento de todos, ainda no recinto, deve ser discreto, sem elevar demasiada­mente a voz, sem gargalhadas estrepitosas, embora estejam todos, usualmente, felizes e bem-humorados, por mais uma noite de tra­balho redentor.
Antes de se retirarem, em ordem e discretamente, é distri­buída a água.
É preciso, porém, observar que o trabalho dos componentes de um grupo mediúnico não termina com o encerramento da sessão. Mesmo durante o espaço de tempo que vai de uma reunião à pró­xima, de certa forma todos estão envolvidos nas tarefas. Inúmeras vezes, os Espíritos em tratamento nos dizem claramente que nos seguiram em nossa atividade normal. Desejam testar a boa-von­tade, avaliar a sinceridade, ajuizar-se do comportamento de cada membro do grupo, especialmente do médium pelo qual se mani­festaram e do dirigente que se incumbiu de doutriná-los, É pre­ciso que se tenha o cuidado para não pregar uma coisa e fazer outra inteiramente diversa. Por outro lado, aqueles companheiros particularmente enfurecidos tentarão, no desespero inconsciente em que se acham, envolver-nos com seus artifícios. Se, no decorrer da semana, oferecemos brechas causadas por impulsos de cólera, de maledicência, de intolerância, de invigilância, enfim, estaremos admi­tindo, na intimidade do ser, emanações negativas que os compa­nheiros infelizes estão sempre prontos a emitir contra nós, na esperança de nos neutralizar, para que possam continuar no livre exercício de suas paixões e desvarios. Todo cuidado é pouco. Nos momentos em que sentirmos que vamos fraquej ar, recomenda-se uma parada para pensar e uma pequena prece, qualquer que seja o local onde nos encontremos. Os irmãos desesperados certamente nos cobrarão, no próximo encontro, as fraquezas que conseguiram identificar em nós. É claro que não nos podemos colocar como seres puríssimos e redimidos, incapazes de errar. Estejamos, assim, preparados para uma interpelação, pois eles o farão, certamente.
Certo Espírito, em grande estado de agitação — desencarnação recente, em circunstâncias trágicas — me pediu que falasse com sua mãe, que eu conhecia. Embora eu não o tenha prometido, pois não tinha ainda o que dizer à pobre senhora, o Espírito me cobrou, logo na sessão seguinte:
— Você não falou com a minha mãe!
Respondi-lhe que não tinha ainda uma palavra tranqüilizadora para dizer a ela, e não podia, evidentemente, falar do verdadeiro estado de aflição em que se encontrava ele.
Outro me disse, ao cabo de uma semana particularmente an­gustiosa para mim, em virtude de terrível pressão de problemas humanos, que nada tinham a ver com o trabalho mediúnico:
— Esta semana eu quase te peguei. Ainda te pego!

*

É oportuno colocar, aqui, um argumento muito válido, em favor da continuidade dos trabalhos e da assiduidade dos médiuns. Como não ignoram, aqueles que cuidam desses problemas, os mentores espirituais escolhem, para cada manifestante, o médium que lhe seja mais indicado pelas características da mediunidade ou pela natureza do trabalho a ser realizado. Feita a ligação, o Espírito, ao voltar, nas vezes subseqüentes, virá usualmente pelo mesmo mé­dium. Se o médium falta, o trabalho junto ao sofredor fica como que em expectativa, suspenso, aguardando a próxima oportunidade. Assim, a não ser por motivos muito fortes e justificados, a assi­duidade dos médiuns e a continuidade do trabalho são vitais ao seu bom rendimento.

*

Ainda uma sugestão. É sempre útil que alguém se incumba de anotar, num caderno, um resumo do trabalho realizado em cada reunião. Isto não é, porém, uma ata, a não ser que a sessão seja de pesquisa. Quando se trata de tarefa de desobsessão, não é pre­ciso ir a esses rigores. A prática de reproduzir sumariamente os principais aspectos de cada manifestação se revelou sempre de grande alcance, não apenas na condução dos trabalhos, mas tam­bém, para o aprendizado constante que representam as tarefas mediúnicas.
Anote-se a data e, querendo, o número de ordem da sessão, para referência. Descreva-se cada manifestação e faça-se um resumo do diálogo mantido com o Espírito. Se a comunicação final for gravada, basta uma referência identificadora. Essa tarefa deve caber, de preferência, ao dirigente ou a alguma pessoa que se mantenha lúcida — sem transe mediúnico — durante toda a sessão.
Sugere-se, como modelo, a série de livros publicados pela Fe­deração Espírita Brasileira, sob o título “Trabalhos do Grupo Ismael”, preparados com extremo cuidado e competência pelo Dr. Guillon Ribeiro.
Lamentavelmente, esses livros se acham, hoje, esgotados, mas bibliotecas especializadas dispõem de exemplares, para consulta.


LIVRO DIALOGO COM AS SOMBRAS - HERMÍNIO C. MIRANDA

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