O Essencial
Face ao inevitável processo de crescimento do Eu profundo, a
vida assume características variadas, e as oportunidades se deparam convidativas,
acenando com a libertação, que somente se consegue a penosos esforços.
Na fase inicial da predominância egocêntrica, o ser projeta-se
no mundo com o qual se identifica, aprisionando-se no emaranhado das coisas
exteriores, sob conflitos que não tem condições de administrar, quase sempre
desequilibrando-se e passando a estados neuróticos de insatisfação, ansiedade,
medo ou a alucinações variadas.
O apego, essa fixação perturbadora à impermanência, a que
pretende dar perenidade, constitui-lhe a meta existencial.
Mais tarde, em tentativas de desvencilhamento da situação
psicológica infantil, avança para a posição egoísta, cultivando os valores
pessoais, narcisistas, com os quais se engolfa, despertando na amargura, sob
os camartelos do tempo degenerador e da frustração tormentosa.
O essencial, quase sempre, permanece-lhe em plano secundário na
paisagem psicológica das aspirações conflitivas.
À medida que
amadurece, transfere-se das coisas e prisões egóicas para a conquista da sua
realidade: o desenvolvimento do Eu profundo que deve predominar comandando os
anelos e programas de libertação.
Somente a consciência de si propiciar-lhe-á a visão
diferenciadora dos fenômenos perturbadores, em relação àqueloutros de
plenificação.
Buscando interpretar, De Ropp classificou os níveis de
consciência em cinco estágios: consciência de sono sem sonhos; de sono com
sonho; de sono acordado; de transcendência do eu e de consciência cósmica...
Para ele, o homem evolve de maneira inesperada, às vezes, de um
para outro nível, especialmente nos dois primeiros estágios de adormecimento...
Mediante psicoterapia acurada e exercícios cuidadosos, logra-se
o avanço pelos diversos patamares, até a etapa final, que se torna de difícil
verbalização face às emoções e descobrimentos conseguidos, nesse momento de
perfeita integração com o que poderíamos chamar o Logos, o pensamento divino.
No primeiro nível — quando se transita no sono sem sonhos —
apenas os fenômenos orgânicos automáticos se exteriorizam, assim mesmo sem o
conhecimento da consciência, tais: respiração, digestão, reprodução, circulação
sanguínea...
Como se estivesse anestesiada, ela não tem ação lúcida sobre os
acontecimentos em torno da própria existência, e a ausência de vontade do
indivíduo contribui para o seu trânsito lento do instinto aos pródromos da
razão.
No segundo nível, o sono com sonhos, ele libera clichês e
lentamente incorpora-os à realidade, passando pelas fases dramáticas — os
pesadelos, os pavores — para os da libído — ação dos estímulos sexuais — e os
reveladores — que dizem respeito à parcial libertação do Espírito quando o
corpo está em repouso...
O desenvolvimento da consciência atinge o terceiro nível, o de
sono acordado, no qual a determinação pessoal, aliada à vontade, conduz o ser
aos ideais de enobrecimento, à descoberta da finalidade da sua existência, às
aspirações do que lhe é essencial, ao auto-encontro, à realização total.
Naturalmente, a partir daí, ascende ao quarto estado, que é a
descoberta da transcendência do eu, a identificação consigo mesmo, com a
conseqüente liberação do Eu profundo, realizando a harmonia íntima com os
ideais superiores, seu real objetivo psicológico existencial.
A superação dos conflitos, das angústias, a desidentificação
dos conteúdos psicológicos afugentes, permitem a iluminação, e a próxima é a
meta da vinculação com a consciência cósmica.
Nem sempre, porém, o homem e a mulher conseguem alcançar esse
nível ideal, fenômeno que, não obstante, será realizado através das
reencarnações que lhes facultarão a vitória sobre os carmas negativos e,
mediante as leis de causa e efeito, passo a passo, em esforço contínuo poderão
fazê-lo.
Da mesma forma, a reencarnação aclara a cartografia da
consciência de De Ropp, quando ele analisa os níveis que diferenciam os
indivíduos na imensa mole humana.
As experiências acumuladas promovem ou retêm o indivíduo nos
fenômenos decorrentes das ações praticadas, beneficiando-os ou afligindo-os com
as sombras que lhes permanecem dominadoras, na condição de resíduos
espirituais. A consciência filtra-os e, por não os poder digerir, transforma-os
em conflitos, perturbações, estados psicopatológicos, requerendo terapias
especializadas e contínuas.
Em qualquer nível, porém, a partir do sono com sonhos, a vontade
desempenha um papel relevante, impulsionando o ser a novas realizações e
conquistas completadoras que enriquecem o arsenal psicológico, amadurecendo o
essencial à vida e selecionando-o do amontoado egóico do supérfluo.
Psicoterapeuta Excepcional com a Sua visão realista e criativa,
Jesus definiu a necessidade de buscar-se primeiro o reino dos Céus, pois que
esse fanal ensejaria a conquista de todas as outras coisas. E óbvio que, ao se
adquirir o essencial, todas as coisas perdem o significado, por se encontrarem
destituídas de valor face ao que somente é fundamental. Outrossim, alertou
sobre o imperativo de fazer-se ao próximo o que se gostaria que este lhe
fizesse, fixando no amor o processo de libertação, na ação edificante o meio de
crescimento e na oração fortalecedora a energia que proporciona o desiderato.
Esse desempenho favorece a perfeita identificação do sentimento
com o conhecimento, resultando na conquista do Eu profundo em sintonia com a
Consciência Cósmica.
O SER CONSCIENTE - Divaldo Pereira Franco/Joanna de Ângelis