Estudar, pesquisar e refletir é a melhor maneira de se compreender os fatos. O bate papo que tivemos com o historiador Eduardo Carvalho Monteiro quando fomos conhecer o seu acervo pessoal de mais de vinte e cinco mil livros que será transferido para o Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo, possibilitou uma grande reflexão a respeito das histórias que a história guarda. Eduardo Carvalho salientou durante a entrevista, que os espíritas, nesses 150 anos de introdução do Espiritismo no país, participaram ativamente do movimento social do Brasil construindo uma cultura própria e participando da formação cultural de nossa sociedade, mas que a geração atual nunca refletiu sobre isso. Em outras palavras, gerando uma cultura, o movimento espírita tem deixado sua marca em aspectos sociais, culturais e conjunturais do país.
No século XIX, a cultura do país estava concentrada na Corte e recebeu grande influência francesa, isso porque os filhos dos nobres costumavam estudar na França. Dentre as novas idéias que trouxeram da Europa, estava o espiritismo, codificado por Allan Kardec, um típico intelectual francês. Encontrou na terra colonizada pelos portugueses um campo fértil para seu desenvolvimento, devido a grande miscigenação entre o catolicismo e o mediunismo existente entre os negros. O ideário espírita, assim como de outras correntes filosóficas desse século, desejava e lutava pela liberdade de pensamento e outras teses sociais, o que provocou grande repressão do poder dominante, a monarquia absolutista e sua parceira, a Igreja. Reconhecer-se seguidor do espiritismo nessa época era extremamente perigoso.
Os registros históricos mostram que no ano de 1844 o Marquês de Marica editou um livro no qual estão os primeiros ensinamentos de fundo espírita divulgados no Brasil. A obra é anterior aos estudos de Allan Kardec sobre as mesas girantes. Essa notícia foi publicada na Revista “O Reformador“ de 1944, na página 207.
Alguns anos depois, em 1853, o jornal O Ceará noticiou pela primeira vez, em Fortaleza, com o Barão de Vasconcellos Smith, o fenômeno das mesas girantes e, posteriormente, as experiências realizadas em Pernambuco, Ceará e outros Estados brasileiros. Na época, o assunto atraía muito a curiosidade dos salões de intelectuais da França.
Em 1865, Luis Olímpio Teles de Menezes fundou em Salvador, na Bahia, o primeiro grupo autenticamente espírita do país, que recebeu o nome de Grupo Familiar do Espiritismo. Foi nesse mesmo grupo que surgiu o primeiro periódico do Brasil, O Echo d´Além Tumulo.
Desde então, foram surgindo muitos outros periódicos de propaganda espírita, como o jornal União e Crença, publicado em 1881 pelo Grupo Espírita Fraternidade Areense, na pequena cidade de Areias, em São Paulo.
O espiritismo introduzido e divulgado no Brasil de 1865 até o período da 1a Guerra Mundial (1914-1918) tinha feições européias, mas ganhou peculiaridades próprias, sem descaracterizar a verdadeira obra da Codificação.
Com o término da 1a Guerra Mundial, o espiritismo recebeu grande impulso por oferecer um bálsamo consolador em uma época que a humanidade estava passando por grandes dificuldades e descrença de valores. Aliás, a evolução do espiritismo atravessou diversos períodos de conflitos na história mundial.
FUNDAÇÃO DA FEB E A UNIFICAÇÃO DO MOVIMENTO ESPIRITA:
A FEB (Federação Espírita Brasileira) foi fundada numa terça-feira, 1º de janeiro de 1884. Um fato curioso, é que seu órgão de comunicação e de divulgação da doutrina, o jornal O Reformador, já existia há um ano, lançado em 1883 pelo conceituado fotógrafo Augusto Elias da Silva, o mesmo que fundou, junto com outros companheiros, a FEB.
Especialmente na primeira década de sua existência, a FEB passou por muitas dificuldades, em decorrência de problemas sociais e políticos gerados pela abolição da escravatura e queda do Império. Sua sede mudou diversas vezes de local, chegando quase à extinção devido à falta de recursos financeiros. Em 1895, Adolfo Bezerra de Menezes assumiu a presidência da Instituição e iniciou um trabalho de reconstrução e unificação dos espíritas, obtendo certo êxito em sua tarefa.
Na década de vinte, enquanto outros Estados possuíam sua União Federativa, São Paulo não tinha nenhuma entidade que tivesse conseguido se firmar para coordenar seu movimento espírita. Em 1926 ocorreu uma reunião para dotar o Estado de uma instituição representativa de seu movimento. Foi fundada a Federação Espírita do Estado de São Paulo, que não conseguindo subsistir por muito tempo, foi perdendo sua força, vindo a desaparecer completamente. Só ressurgiu em 1936, dez anos depois, sob outras bases.
Na década de trinta nasceram diversos órgãos divulgadores da doutrina; ocorreram nesse período algumas tentativas para a unificação dos espíritas, mas as quatro entidades federativas: Liga Espírita, União Federativa, Sinagoga Espírita e Federação Espírita encontravam-se disputando a supremacia do movimento espírita paulista.
O idealista Pedro de Camargo, auto-cognominado Vinicius, que tanto se dedicou à causa espírita e participou de diversas ações sobre o assunto, dizia que era preciso reunir todas as Instituições com o mesmo propósito de desenvolvimento do espiritismo no Estado. O comandante Edgard Armond, com o apoio dos conselheiros da Federação, resolveu buscar um caminho para resolver o problema da unificação das sociedades espíritas do Estado. Reuniu as quatro Entidades federativas citadas, e numa decisão histórica, todas concordaram em abrir mão de seus departamentos federativos em prol da criação de uma Entidade única que promovesse, exclusivamente ela, a unificação das sociedades espíritas. Decisão que foi aprovada e resultou, em 5 de junho de 1947, na fundação da USE (União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo) durante o 1 Congresso Espírita Estadual.
Outro momento marcante da história do Espiritismo foi a realização da Conferência do Rio de Janeiro, em 5 de outubro de 1949, que ficou conhecida como “Pacto Áureo”. Nessa conferência foi criado o “Conselho Federativo Nacional”, com o objetivo de unificar o movimento espírita brasileiro. Assinaram o acordo representantes da FEB, USE, Liga Espírita do Brasil, Comissão Executiva do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita, União Espírita Mineira, Federação Espírita Catarinense e do Paraná. Essa iniciativa de unificação possibilitou o surgimento de novos caminhos para a união do movimento de todo o Brasil.
Uma nova fase
Muitos foram os nomes que contribuíram para a propagação e a consolidação do Espiritismo no Brasil ao longo da história. Homens e mulheres abnegados, à frente de seu tempo, e principalmente dedicados aos ideais espiritistas. Personalidades como Eurípedes Barsanulfo, Batuíra, Cairbar Schutel, Anália Franco, Bezerra de Menezes, J. Herculano Pires, entre tantas outras figuras importantes, que estas linhas não seriam suficientes para enumerá-las.
Mas, especificamente se tratando da atualidade, não há como negar que um homem franzino, de saúde frágil, chamado Chico Xavier, com o exemplo de sua alma nobre, deu inicio a uma nova fase na divulgação da doutrina espírita. Em 1932, com a publicação pela FEB do livro Parnaso de Além-Túmulo – primeiro livro psicografado por Chico Xavier – estava vindo a público um dos maiores médiuns de todos os tempos. Viveu praticamente toda sua vida em prol do próximo e deixou como herança para a humanidade, por intermédio de sua psicografia, um acervo precioso de conhecimento.
É preciso lembrar, também, que seu trabalho abriu muitas portas para que outros médiuns e trabalhadores da Seara do Mestre pudessem divulgar mais o espiritismo. Não é à toa que a maioria dos eventos espíritas estão sempre lotados, médiuns como Divaldo Pereira Franco arrastam verdadeiras multidões para suas palestras e programas de rádio e TV com temática espírita estão ganhando seu espaço.
Do nascimento da doutrina espírita na França ao seu florescimento no Brasil, muitos fatos ocorreram e várias pessoas lutaram e ainda continuam lutando para que os verdadeiros princípios do Consolador Prometido não se percam no caminho.
A evolução dos meios de comunicação, como a internet, possibilitou a quebra de barreiras no universo da informação. O bom uso da tecnologia aliado à boa vontade dos aprendizes da Boa Nova pode ser o começo de uma nova era para o espiritismo.
Trecho transcrito do livro “Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho”. Psicografia de Chico Xavier ditado pelo espírito Humberto de Campos:
“Brasileiros, ensarilhemos, para sempre, as armas homicidas das resoluções!... Consideremos o valor espiritual do nosso grande destino! Engrandeçamos a pátria no cumprimento do dever pela ordem, e traduzamos a nossa dedicação mediante o trabalho honesto pela sua grandeza! Consideremos, acima de tudo, que todas as sua realizações hão de merecer a luminosa sanção de Jesus, antes de se fixarem nos bastidores do poder transitório e precário dos homens! Nos dias de provação, como nas horas de venturas, estejamos irmanados numa doce aliança de fraternidade e paz indestrutível, dentro da qual deveremos esperar as claridades do futuro.
Não nos compete estacionar, em nenhuma circunstância, e sim marchar, sempre, com a educação e com a fé realizadora, ao encontro do Brasil, na sua admirável espiritualidade e na sua grandeza imperecível”.
Artigo publicado na Revista Cristã de Espiritismo, edição 31.
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