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23 de jun. de 2011

O Livro dos Médiuns - O papel dos médiuns nas comunicações espíritas




     Allan Kardec e os Espíritos Erasto e Timóteo analisam  questões fundamentais sobre a prática mediúnica, visando aos que integram um grupo mediúnico, ou dele desejam fazer parte, no capítulo XIX de O Livro dos Médiuns. Em razão da seriedade e utilidade dos esclarecimentos, o capítulo é indicado como leitura indispensável aos espíritas interessados por essas atividades. Entre todas as ideias aí desenvolvidas duas se sobressaem e são continuamente retomadas pelos citados orientadores: o valor do conhecimento espírita e a boa conduta moral dos médiuns.
     Considerações sobre o transe mediúnico – denominado de estado de crise à época de publicação do livro – assinalam o início do estudo. Por se tratar de um estado especial, o de alteração da consciência, o transe pode ser mais ou menos acentuado e conduzir à fadiga, que é reparada pelo repouso.1 Sabe-se, porém, que o desgaste energético decorrente dos transes mediúnicos é relativo, pois há médiuns que raramente apresentam fadiga, antes, durante ou após a prática mediúnica. A questão da fadiga envolve outros fatores que devem ser considerados: constituição orgânica, idade, presença/ausência de enfermidade, estilo de vida, uso de certos medicamentos etc.
      O estado de transe apresenta gradações: nos transes profundos, usuais nos sonambúlicos e nos psicógrafos mecânicos, os médiuns não se recordam dos acontecimentos ocorridos durante a transmissão da mensagem. Em  relação aos  psicógrafos mecânicos, afirma  Kardec que  “o pensamento vem depois do ato da escrita”. 2 Em oposição, o transe dos médiuns intuitivos é leve, superficial:
     
[...] o médium intuitivo age como faria um intérprete. Este, de fato, para transmitir o pensamento, precisa compreendê-lo e, de certo modo, apropriar-se dele, para traduzi-lo fielmente. Entretanto, esse pensamento não é seu, apenas lhe atravessa o cérebro. É exatamente este o papel do médium intuitivo. 3
     
Entre os dois extremos há uma ampla gradação de estados alterados da consciência.O médium semimecânico, por exemplo, apresenta aspectos do transe profundo e do transe superficial:
     
[...] Sente que sua mão é impulsionada contra sua vontade, mas, ao mesmo tempo, tem consciência do que escreve, à medida que as palavras se formam. 2

      Outro tópico analisado no texto refere-se à participação do médium durante a transmissão do ditado mediúnico. Em princípio, tal intervenção é considerada normal dentro de um limite aceito como tolerável, no qual não se evidencie qualquer interferência no pensamento/ideias do Espírito comunicante. Assim, toda mensagem mediúnica traz o colorido da personalidade do médium.Quando bem ajustada, essa parceria médium-Espírito define as bases da  passividade mediúnica: o médium é considerado passivo “[...] quando não mistura suas próprias ideias com as do Espírito que se comunica [...]. Seu concurso [o do médium] é sempre necessário, como o de um intermediário, mesmo quando se trata dos chamados médiuns mecânicos”. 4
     Com base na orientação de Kardec de que o intermediário encarnado funciona sempre como um intérprete, mesmo em se tratando de sonâmbulos e de médiuns mecânicos, é óbvio que sempre ocorrerá alguma interferência anímica:
     O Espírito do médium é o intérprete, porque está ligado ao corpo que serve para falar e por ser necessária uma cadeia entre vós e os Espíritos que se comunicam, como é preciso um fio elétrico para transmitir uma notícia a grande distância, desde que haja, na extremidade do fio, uma pessoa inteligente que a receba e transmita. 
      No que tange às aptidões especiais demonstradas por alguns médiuns – outro tema estudado no capítulo –, como: transmissão de mensagens em línguas estrangeiras, recebimento de poemas, composições musicais e desenhos etc., há o esclarecimento de que, em geral, tais médiuns adquiriram essas habilidades em existências anteriores, mesmo que na atual reencarnação não sejam ostensivamente detectadas. Entretanto, podem ser recuperadas durante a comunicação mediúnica, 6 uma vez que  “os conhecimentos adquiridos jamais são perdidos pelo Espírito”. 7 Todas essas aptidões, ensinam os orientadores espirituais, “são formas de expressão do pensamento. Os Espíritos se servem dos instrumentos que lhes oferecem mais facilidade”. 
     O mesmo princípio se aplica à aptidão de certos médiuns para movimentar  e deslocar objetos a distância. Nesta circunstância, os objetos são impregnados por fluidos especiais, os ectoplásmicos, liberados pelos médiuns, e outros retirados da Natureza e do mundo espiritual, os quais são associados e adequadamente manipulados pelos desencarnados com a finalidade de provocar a manifestação do fenômeno espírita. 9
     A transmissão de mensagens, sobretudo as instrutivas, está diretamente subordinada ao conhecimento que o médium possui, que é secundado pela sua conduta moral. O conhecimento, porém, é visto como fator essencial no estabelecimento de afinidades entre os dois planos de vida:

[...] se não houver afinidade entre eles, o Espírito do médium pode alterar as respostas e assimilá-las às suas próprias ideias e inclinações. Porém, não exerce influência sobre os Espíritos comunicantes, autores da respostas. É apenas um mau intérprete. 10

     Não sendo superadas as dificuldades de sintonia (afinidade) mental entre o médium e o Espírito, a comunicação pode se tornar inviável, ou, caso ocorra, não será de boa qualidade. Este tem sido um dos maiores obstáculos encontrados na prática mediúnica, especialmente se a mensagem é subscrita por Espíritos conhecidos e de notório saber. Justifica-se, assim, porque os Espíritos esclarecidos procuram 
[...] o intérprete que mais simpatize com eles e que exprima com mais exatidão os seus pensamentos. Não havendo simpatia entre eles, o Espírito do médium é um antagonista que oferece certa resistência, tornando-se um intérprete de má qualidade e muitas vezes infiel. É o que acontece entre vós, quando a opinião de um sábio é transmitida por um homem estouvado ou alguém de má-fé. 11

     No final do capítulo XIX, Erasto e Timóteo apresentam esclarecedora dissertação mediúnica, uma verdadeira aula que ensina como os médiuns podem se tornar bons instrumentos, exercendo com equilíbrio e sabedoria o papel que lhes cabe nas comunicações espíritas. Destacamos algumas como ilustração: 12

• [...] nos comunicamos com os Espíritos encarnados dos médiuns [...] tão só pela irradiação do nosso pensamento.
• Os nossos pensamentos não precisam da vestimenta da palavra para serem compreendidos. [...] Quer dizer que tal pensamento pode ser compreendido por tais ou quais Espíritos, conforme o adiantamento deles [...].
•  Assim, quando encontramos em um médium o cérebro repleto de conhecimentos adquiridos na sua vida atual e o seu Espírito rico de conhecimentos latentes, obtidos em vidas anteriores [...] preferimos nos servir dele, porque com ele o fenômeno de comunicação se torna muito mais fácil para nós [...].
• Com um médium cuja inteligência atual ou anterior se ache desenvolvida, o nosso pensamento se comunica instantaneamente de Espírito a Espírito, graças a uma faculdade peculiar à essência mesma do Espírito. Nesse caso, encontramos no cérebro do médium os elementos apropriados a dar ao nosso pensamento a vestimenta da palavra que lhe corresponda, e isto quer o médium seja intuitivo, semimecânico ou inteiramente mecânico. [...]
• É por isso que, seja qual for a  diversidade dos Espíritos que se comunicam com um médium, os ditados que este obtém, ainda que procedendo de Espíritos diferentes, trazem, quanto à forma e ao colorido, o cunho que lhe é pessoal. [...]
 
Referências:
1 KARDEC, Allan.  O livro dos médiuns. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. Cap. 19, it. 223.  
2 ______. ______. Cap. 15, it. 181.  
3 ______. ______. It. 180, p. 282.  
4 ______. ______. Cap. 19, it. 223, subit. 10.  
5 ______. ______. Subit. 6.  
6 ______. ______. Subit. 17.  
7 ______. ______. Subit. 20.  
8 ______. ______. Subit. 21.  
9 ______. ______. Subit. 12 a 14.  
10 ______. ______. Subit. 7.  
11 ______. ______. Subit. 8.

12 ______. ______. It. 225, p. 352-353.


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